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SAÚDE: CONDIÇÃO DA DIGNIDADE HUMANA




A espécie humana, detentora de um potencial ilimitado, designadamente ao nível mental, é, simultaneamente, muito frágil, vulnerável a fenómenos que ainda não controla totalmente e que, por via desta sua insuficiência, está exposta a situações que, inclusivamente, quando não resolvidas, ou mal solucionadas, conduz à morte física. É neste contexto que a saúde, e/ou a falta dela, constitui uma permanente preocupação para cada pessoa.

Há setores que, num estado social democrático, com responsáveis sensibilizados para um conjunto de direitos, não podem ser objeto de qualquer falha ou restrição, sobretudo, a saúde, a família, a educação/formação, o trabalho, a habitação e a proteção na infância e na velhice, principalmente nestes dois extremos mais débeis da vida humana, sob pena de violação do mais elementar, quanto justo, direito que a todos deve assistir: o direito à vida com dignidade.

Entre muitas outras, uma das condições essenciais à qualidade de vida é a saúde, e sem esta tudo é secundário e deixa de ter interesse e, como diria Monsieur de La Palice, conduzirá à morte, eventualmente prematura, quantas vezes com grande e atroz sofrimento. A saúde é a condição sem a qual a pessoa humana não se realiza verdadeiramente e a sua falta até pode conduzir, rapidamente, ao suicídio, violento e/ou assistido.

Os documentos fundamentais, que regem: política, social, económica e religiosamente a maioria das nações, contemplam, inequivocamente, o direito à saúde e, por exemplo, a Constituição da República Portuguesa (tal como outras no mundo), é bem clara:

«Todos têm direito à proteção da saúde e o dever de a defender e promover» (CRP, 2004:Artº 64º); por outro lado, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, numa perspetiva muito abrangente, tem implícito, no seu articulado, o direito à saúde: «Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos» (DUDH, 1948:Artº 1º, in BÁRTOLO, 2012:40-41) para, de seguida reforçar a ideia de dignidade com o seguinte preceito: «Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal» (Ibid.: Artº 3º).

A vida sem saúde é uma situação que qualquer Estado, minimamente organizado, na sua vertente social, tem o dever de acautelar, sem olhar a despesas, até porque, de alguma forma, os cidadãos contribuem, através de cargas fiscais enormes, para que um serviço nacional de saúde funcione equitativa e eficazmente para todos. A proteção da saúde não é compatível com políticas economicistas, de resto, quanto mais pessoas estiverem doentes, mais encargos financeiros provoca, então, para se evitar os alegados “gastos insustentáveis”, prevenir será a estratégia a seguir.

Em todo o caso e numa análise salomónica, mas também constitucional, os cidadãos têm, igualmente, o dever de defender e promover a saúde, aliás, há instituições, modelarmente organizadas, como a militar, cuja regulamentação exige dos seus colaboradores o dever de cuidar da saúde e higiene pessoais: «11.º Conservar-se pronto para o serviço, evitando qualquer acto imprudente que possa prejudicar-lhe o vigor ou aptidão física ou intelectual; 44.º Manter hábitos de higiene (…)» (Decreto-Lei n.º 142/77, Artº 4º de 09 de Abril, com diversas alterações).

É perfeitamente compreensível que cada pessoa deve fazer por merecer a dignidade que lhe é reconhecida, desde a sua própria conceção. Cada cidadão é tanto mais digno, merecedor do respeito coletivo, quanto mais e melhor exercer os seus direitos e cumprir com os seus deveres.

A saúde é um direito e um dever de cada pessoa. Pela saúde tudo se deve fazer, porque de facto é o maior e o mais importante bem da existência humana. É normal que num conjunto de preocupações, a esmagadora maioria das pessoas coloque a saúde, quase sempre, em primeiro lugar.

Inquestionavelmente que compete ao Estado Social, através dos respetivos governantes: criar, apoiar e melhorar todo um sistema nacional de saúde pública universal, porque é este mesmo Estado que detém os recursos para este serviço público: infraestruturas, financeiros, humanos, tecnologia, investigação, formação e atualização dos respetivos profissionais, porque para este objetivo se exige dos contribuintes uma participação monetária colossal.

O investimento na saúde é, portanto, prioritário e deve ser o último setor da organização do Estado a sofrer cortes no respetivo orçamento, considera-se, mesmo, que deve haver canalização permanente de recursos, certamente, com racionalidade, justiça e eficácia, cabendo a todos os demais intervenientes, técnicos e utentes, colaborarem de forma responsável para se evitarem desperdícios e/ou mau aproveitamento dos recursos destinados à saúde.

A sensibilização coletiva: sistema de saúde e utentes afigura-se, apesar dos tempos difíceis em que vivem muitas nações e seus cidadãos, uma boa estratégia, a seguir com toda a urgência, precisamente a partir de uma eficaz, clara e bem definida campanha de ações diversas: informativa, de natureza publicitária-institucional; formações modulares para os cidadãos, a partir de uma determinada idade, eventualmente, dezoito anos, precedida de uma disciplina a ser ministrada durante o percurso educativo obrigatório e, também, no contexto laboral, por forma, inclusive, a satisfazer o disposto no código do trabalho, quanto à obrigatoriedade de formação mínima de 35 horas anuais.

E se o cidadão comum tem o dever de cuidar da sua própria saúde, não é menos verdade que os agentes que integram, nas mais diversificadas funções, o sistema nacional de saúde, tal como o têm vindo a fazer, numa permanente e, em muitas situações, dir-se-ia quase apostólica dedicação, que se lhes reconhece e, ao mesmo tempo, exige, também estes se lhes pede ainda um maior esforço, se tal é possível, porque, em bom rigor, e no que às classes médica, de enfermagem e técnicos de um vasto conjunto de exames, são estes trabalhadores que têm em suas mãos, isto é, nos seus conhecimentos e procedimentos, a vida de todas as pessoas, através de uma boa saúde de todos os cidadãos.

Respeita-se a importância destes profissionais. Eles sabem muito bem que grande parte dos mesmos adquiriu um estatuto socioprofissional dos mais fortes e influentes em quase todo o mundo, são classes de especialistas poderosíssimas, que possuem uma formação técnico-científica e humanista muito avançada, para a qual também os contribuintes participaram e por isso, também é justo que se entreguem, de corpo e alma, como é sabido que a maioria já o faz, a esta causa tão nobre como é a de defender a saúde dos seus concidadãos.

Os profissionais da saúde, designadamente, os médicos, pelo juramento exigido pelo seu patrono, Hipócrates, também ele médico e filósofo grego, comprometem-se a lutar pela vida, pela boa saúde dos seus semelhantes, mas antes dessa condição, são pessoas humanas, seguramente ávidas de sucesso, de bons resultados na sua atividade mas, tal como em quaisquer outras profissões, não são detentores da verdade absoluta, da perfeição, da infalibilidade e, compreensivelmente, cometem erros, até porque, trabalhar com o corpo e o espírito humanos, não é a mesma coisa que operar com uma máquina qualquer.

Seria injurioso pensar-se que quando uma determinada intervenção/ato médico corre menos bem e seguem-se consequências graves para o doente, incluindo desfechos fatais, tal se fique a dever, de imediato, a premeditação maldosa, negligência grosseira e voluntária do médico.

Claro que se cometem erros, então investiguem-se as suas causas e se corrijam, para o futuro, que se responsabilizem, com verdade e justiça quem o deve ser, porém, percebe-se menos quando, a partir de uma falha involuntária do profissional se buscam proveitos materiais, porque esta exigência será sempre no limite que deverá ser formulada, depois de tudo muito bem esclarecido, sem quaisquer dúvidas, então sim, a imputação deve ser atribuída.

A responsabilização por atos que se praticam deverá, portanto, ser extensível a todas as atividades: políticas, religiosas, empresariais e cívicas.

Nesta linha de pensamento, o cidadão-utente também poderá ser responsabilizado, por exemplo, quando não cuida, adequadamente, da sua saúde, não cumpre as prescrições médicas e terapêuticas, quando se provar que utiliza o sistema nacional de saúde para outros fins que não especificamente cuidar da sua própria saúde.
Em todo o caso é preciso ter muito cuidado, porque é verdade que milhares de cidadãos não cumprem as determinações médicas, nomeadamente medicamentosa e exames clínicos, por insuficiência económica e/ou porque uma ou outra medicação permanente não é suficientemente comparticipada.

Aqui entra-se num círculo vicioso: as pessoas ou estão desempregadas; ou auferem salários pequenos; ou têm reformas insignificantes; ou, ainda, o governo retira direitos adquiridos, reduz rendimentos aos cidadãos, através de cortes nos salários e aumentos brutais de impostos, de tal forma que as pessoas, por muito que se esforcem para preservar a saúde, ou tratarem-se convenientemente, acabam por não ter uma vida digna, saudável, portanto, os principais responsáveis pela governação devem estar muito atentos à saúde dos cidadãos, designadamente, quanto às classes mais desfavorecidas.

Assiste-se, com inaceitável frequência, que muitas pessoas, precisamente as mais desprotegidas: idosas, desempregadas, doentes crónicos, crianças, quando se dirigem às farmácias, não adquirem todos os medicamentos prescritos, nem fazem os tratamentos, exames clínicos necessários, porque os seus rendimentos, economias e capacidade financeira não lhes permitem terem o direito de se tratarem adequadamente e, entre passar fome e tratarem, fazem as suas opções.

É justo que aqui e agora, se diga uma palavra de apreço aos responsáveis pelas farmácias que, generosamente, fornecem os medicamentos “à moda antiga”: fiado. Trata-se de um ato de grande solidariedade para com os mais necessitados, atitude que outros responsáveis, na esfera política, podem muito bem reforçar, com apoios substanciais aos que mais precisam.
De harmonia com o aforismo popular: “com a saúde não se pode brincar” e com a saúde pública, em geral, e dos cidadãos em particular, todas as medidas que se destinem a melhorá-la serão sempre bem-vindas, legítimas, justas e necessárias.

A dignidade da pessoa humana passa, indiscutivelmente, pelos cuidados de saúde, pela educação/formação, pelo trabalho, pelas boas condições de vida e nunca pela delapidação dos bens dos cidadãos, porque se é necessário honrar compromissos nacionais e internacionais, isso envolve o respeito que é devido ao cidadão, à família, ao seu trabalho, ao seu património.

A saúde é um dos maiores e mais importantes bens que se pode ter, e um dos inquestionáveis valores, que contribuem para a dignidade da pessoa humana, do cidadão comum, anónimo, a quem se lhe impõem impostos colossais e ilegítimos sem, todavia, lhe dar o conforto, a segurança e a tranquilidade necessárias. A crueldade de certas medidas é inaceitável em pleno século XXI.

BIBLIOGRAFIA

BÁRTOLO, Diamantino Lourenço Rodrigues de, (2012). Direitos Humanos: Alicerces da Dignidade. 1ª Edição, Lisboa: Chiado-Editora.
MINISTÉRIO DA DEFESA NACIONAL (1977). Regulamento de Disciplina Militar, aprovado pelo (Decreto-Lei n.º 142/77, de 09 de Abril.

“NÃO, ao ímpeto das armas; SIM, ao diálogo criativo/construtivo. Caminho para a PAZ”
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Venade/Caminha – Portugal, 2024
Com o protesto da minha permanente GRATIDÃO
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente HONORÁRIO do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal
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