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Socialismo Utópico de Silvestre Pinheiro Ferreira (1769-1846)




Desde a chegada ao Brasil, que Pinheiro Ferreira encontrou várias dificuldades, designadamente ao nível da sua plena integração na sociedade, onde passou privações de vária ordem, pese embora a auréola de intelectual e político muito competente, o que – como já foi anotado anteriormente, noutro contexto – se: por um lado, favoreceu; por outro, suscitou a intriga e a animosidade da parte de setores que, certamente por inveja, não desejavam que ele viesse a beneficiar de um estatuto compatível, porquanto, certamente, pelas suas qualificações, lhe era atribuído.

Em todo o caso, como homem dotado de grandes qualidades, não se deixou intimidar, exercendo, então, a atividade de jornalista, como colaborador de um periódico científico denominado “O Patriota”, que cobria vários domínios, desde o literário ao político, passando vos pelo mercantil, e se publicou durante dois anos consecutivos (1813-14).

Por esta altura, Silvestre Ferreira estaria desempregado, mas foi também em 1813 que, pela primeira vez, se iniciou no Brasil a lecionação de aulas de Filosofia, a partir das suas “Prelecções Filosóficas”, ministradas num curso anunciado pela “Gazeta do Rio de Janeiro”, em 14 de abril de 1813. (VARNHAGEN, 1975:224-Nota 84).

A colaboração de Pinheiro Ferreira no periódico “O Patriota” não foi inocente, porque um dos primeiros atos de D. João VI, quando se instalou no Rio de Janeiro, foi a criação da Impressão Régia, por decreto de 13 de maio de 1808, que constituía como que uma delegação da Imprensa Nacional e que, inicialmente, tinha por objetivo imprimir toda a documentação, legislação e assuntos diplomáticos, bem como obras diversas. Para a administração da Imprensa Régia, criou-se uma Junta Diretora, da qual fazia parte Silvestre Pinheiro Ferreira. (cf. MARTINS, 1957:346).

Sabe-se que D. João VI tinha grande apreço por Pinheiro Ferreira, e que esta postura do monarca ir-se-ia reforçando ao longo dos anos, na medida em que, sempre que o monarca solicitou a opinião do filósofo, este retribuía com lealdade e dedicação. Estar-se-ia a ser injusto, se se formulasse a ideia de que Silvestre Ferreira não teve preocupações sociais. Mostram-no os seus trabalhos elaborados em Paris.

Sem nunca renegar os seus ideais liberais e monárquico-constitucionais, para os fundamentar recorreu ao estudo do socialismo utópico, e das utopias de Platão e Campanella, procurando conciliar a liberdade com a justiça social, por meio de propostas associativistas.

Nesse sentido, o seu “Projecto de Associação das Classes Industriosas”, é significativo e justificativo, quanto ao seu pensamento social: «a associação de classes industriosas será composta de todas as pessoas que quiserem assegurar-se mutuamente um auxílio fraternal para os casos em que acidentes naturais, a maldade dos homens, ou o abuso do poder, houverem causado prejuízos inevitáveis.» (FERREIRA, 1840:47).

Neste projeto, Silvestre Pinheiro Ferreira traça as grandes linhas do funcionamento das associações: a Organização dos Grémios Industriosos em geral, (onde incluía a regulamentação da agricultura e das artes agrícolas), o Grémio do Comércio, o Grémio das Artes e Ofícios, bem como Grémios anexos ao serviço do Estado; a organização de escolas e oficinas de instrução; casas de saúde e casas de retiro; estabelecimentos de recreação e divertimento, concluindo o seu projeto com a exposição dos motivos que o determinaram, e um mapa demonstrativo do método eleitoral para essas instituições.

Silvestre Pinheiro Ferreira não tinha uma ideia muito favorável quanto às consequências sociais da dinâmica liberal no panorama europeu, destinando o seu projeto, em primeira aplicação, à sociedade portuguesa. Preocupavam-no: a concentração da propriedade (considerada como principal causa das desigualdades entre ricos e pobres); a elevada carga fiscal remanescente do regime feudal; a galopante agiotagem e o crescente pauperismo do povo, que conduzia à marginalidade.

Estas preocupações estão patentes na carta que endereçou a Osborne Henrique de Sampaio, aquando da apresentação do projeto de Associação das Classes Industriosas: «A classe industriosa, ou que vive do seu trabalho, bem que seja a mais numerosa e útil à sociedade, tem sido, infelizmente, até agora, em toda a parte, menos contemplada e favorecida do que podia e devia ser. (...)

A miséria que a oprime em Portugal está essencialmente conexa com as causas que nos trouxeram o estado político, em que nos achamos; e tanto aquela, como esta desgraça, não podem achar verdadeira cura, senão em uma adequada e completa reforma da organização social.» (Ibid.:41).

Na análise sobre “Questões de Direito Público e Administrativo, Filosofia e Literatura” (1844), Silvestre Ferreira, interroga-se, se os proprietários de Fundos Nacionais, ou Estrangeiros, devem ser ou não isentos de contribuições sobre rendimentos.

Em seu entender: «sendo a igual distribuição dos encargos uma rigorosa consequência da igualdade dos direitos dos cidadãos, segue-se que todos estes, sem excepção, devem contribuir para as despesas públicas; cada um à proporção do seu líquido rendimento; seja qual for a natureza ou a origem desse rendimento.» (FERREIRA, 1844:273).

Bibliografia

FERREIRA, Silvestre Pinheiro (1840). “Projecto de Associação para o Melhoramento da Sorte das Classes Industriosas”, in: José Esteves Pereira, (1996) (Introdução e Direção de Edição) Silvestre Pinheiro Ferreira, Textos Escolhidos de Economia Política e Social (1813-1851). Lisboa: Banco de Portugal.

FERREIRA, Silvestre Pinheiro (1844) “Questões de Direito Público e Administrativo, Filosofia e Literatura”, in: José Esteves Pereira, (1996) Silvestre Pinheiro Ferreira, Textos Escolhidos de Economia Política e Social (1813-1851), Lisboa: Banco de Portugal.

MARTINS, Wilson, (1957). A Palavra escrita – História do Livro, da Imprensa e da Biblioteca, S. Paulo: Editora Anhembi

Limitada. Págs. 334-363
VARNHAGEM, Francisco Adolfo de, (1975). História Geral do Brasil. Tomo Quinto, 8a ed. São Paulo/SP, Edições Melhoramentos. Nota 84, pág. 224.


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